sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Sóbrio vivo
Dê-me asas
Voar-eu-ei
Sai, enfim, só
Desalado
Só flutuo
Sobrevivo.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Na dúvida: a indiferença, a imobilidade, a desistência e desvalorização. Basta uma confusão e paramos. Até, enfim, a ausência de decisão tomar por si só um caminho e virar uma certeza.

Naquele momento eu funcionava como uma balança e analisa criteriosamente os dois lados, levando em consideração o peso dos braços: o equilíbrio me incentivava a inatividade. Estava estagnada, largada como um saco de lixo na própria cama.

O sentimento de mágoa começou a se alastrar por todo o meu corpo. Um desânimo me motivava a permanecer deitada, sem fazer nada, olhando para o teto. Contando as falhas que a pintura, agora, manifestava, acompanhava com o olhar os insetos que rodeavam o lustre.

Com as asinhas euforicamente batendo, eles queriam a luz. Buscavam pelo prazer instigante que ela oferece, mas se afastavam com medo das atitudes suicidas que se expunham em qualquer avanço mais ousado. Eles ensaiavam a coreografia do lustre, disputando com suas patinhas cheias de esperança a proximidade àquele brilho.

Queria voar em direção à luz, esfregar as patinhas como um louva-deus, saltar livremente sem rumo, somente buscando a sobrevivência. Carregando só o peso do meu corpo e abandonando os medos em outra encarnação. Talvez eu conseguisse atingir o estado metafísico do nada em um salto de grilo.

De repente, um deles perdeu a asa. Ficou caminhando pelo teto “desalado”. Andava de um lado para outro, não sabia qual rumo tomar, ficou impotente sem a possibilidade de voar. Enfim aterrissou no universo daqueles que não voam e caminhava, novamente, em direção a luz.

Virei o rosto para o travesseiro e apaguei a luz. Era melhor dormir. Amanhã seria outro dia.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Li na sua iris

Quando eu quis saber o significado deste brilho, busquei nos seus olhos palavras que me faltavam. Encontrei a ausência do discurso, inebriado. Era pura sinestesia admirar aquele castanho modelado. Foi ali que eu entendi. Você não me dizia o que sentir, só emitia o que eu sempre quis ouvir.

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

1 X 0

Embaixo da ponte tem um campinho
dribla sonhos,
pega, dá o toque,chuta...
bola
vibra quando cai no gol
A emoção rola
Olé!
desperta a torcida no menino
Ola de ir embora

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

O fruto da nogueira

Ata-me
Desenlaça a vontade
Aprisiona em nós
Cego
Noz

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

O pronome da amizade

O filme havia acabado. As garotas ficaram na penumbra dos créditos finais, deixando o letreiro passar em silêncio até assimilarem o que haviam visto. Uma delas puxou o cobertor mais pra cima, a do lado se ajeitou melhor no travesseiro, outra tentou se posicionar melhor na cama de casal e a ultima suspirou.

Formavam um daqueles grupinhos de amigas que estavam juntas fazia anos. Quanto mais próximas, mais passavam por momentos parecidos. Uma começava a namorar e em pouco tempo lá iniciavam as outras também. Uma terminava e, não tinha outra, se o relacionamento estivesse mal das pernas, tudo parava de andar. Até mesmo menstruavam na mesma época, mas isto não era porque os laços eram muito fortes e ultrapassavam até as barreiras biologias na fusão, era, somente, pela convivência mesmo. O corpo feminino compreende algumas coisas que não é possível explicar cientificamente e estes vínculos invisíveis nem elas entendiam como haviam sido atados.

Foram os nós dos anos que teceram os fios deste sentimento. As quatro conjugavam cada vez mais aquela ligação, estreitando vidas com as emoções e aprofundando no conhecimento de si mesmas e de ser humana.

Era encantador observar como se entendiam tão bem e seguiam por caminhos opostos. Quando mais jovens, tinham o universo cheio de portas abertas, mas conforme decidiam os passos, caminhavam por estradas diferentes e os problemas curriculares saiam da pauta dos encontros. Nenhuma falava a mesma língua na faculdade, mas apresentavam o mesmo sotaque. Aprenderam desde pequenininhas a linguagem carinhosa dos nós. Era um nós nos amamos, nós nos queremos bem, nós nos ajudamos, nós falamos a verdade quando precisa, nós. Ao ligar uma para outra, observava-se como sentiam os nós.

E aquele era um momento delas, quando podiam falar livremente e aproveitar o final de semana para colocar o papo em dia. Quanto mais falavam, mais tinham coisas para falar. Contaram dos amores, das desilusões, dos sonhos e expectativas, mas nunca deixavam de lidar com maturidade com as situações mais complicadas que poderiam, como em um tropeço vocálico, torná-las em somente eu.

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Presa Humana

Eu esperei até mais tarde, quando vi que a lua já sobrepunha o dia e sai. Não queria que ninguém visse o que eu estava prestes a fazer. Abri o calabouço da casa e cuidadosamente desci as escadas. Eu estava tensa e minhas mãos apertavam-se continuamente emanando um suor frio desesperador. O ranger dos degraus não me assustava tanto assim, temia muito mais pelo o que eu ia encontrar ali embaixo, deitado no chão. Respirei pausadamente, se eu não me acalmasse não iria conseguir cumprir a minha obrigação.

Eu podia sentir o cheiro do sangue velho e já seco. Meu estômago revirava enojada com as lembranças, estava quase vomitando. Engoli a vontade de ruminar, aquilo era mais importante do que um mal estar qualquer. Raciocine, não se altere, não deixe as emoções dominar. E como se eu ligasse um botão meu momento estóico havia se iniciado.

Pisei no chão sujo, com os vestígios de uma luta sangrenta. Não estava me importando muito com os meus sapatos, em breve tudo estaria limpo e em seus devidos lugares. Meu impulso organizador me direcionou ao morto que jazia ali na penumbra. Olhei naquela face serena e me lembrei de como foi difícil arrancar os seus caninos com o alicate do meu pai.

Ele ainda estava acordado e amarrado em uma cama e se mexia loucamente. Quando viu meu sorriso aquele dia ele achava que ia ganhar mais uma noite de prazer, muito sexo e pouca conversa. Muito gozo e nenhuma cumplicidade. Mostrei a corda com uma cara safada, o amarrei a cama e ele agonizava de ansiedade. Com um simples rebolado em seu membro ele gemeu e fechou os olhos me dando abertura para amarrar um laço firmemente na boca. Os caninos ficaram a mostra.

Enfiei o instrumento na boca dele e com o alicate pressionava o dente para os lados, era complicado com ele se mexendo loucamente. Obstinada, insisti, o sangue escorrendo me dava com mais vontade de aproveitar o momento sádico. Arranquei os dois dentes que ele mais prezava sem nenhuma anestesia. Ele urrou de dor. Para meu deleite ele implorou que eu parasse, estava louco para fugir. Gargalhei e procurei outros instrumentos que me fizessem aproveitar mais ainda o momento sereno.

Encontrei um machado, a serra e chave-inglesa. Preferi os alfinetes e a faca de cozinha que quase não tinha corte. A pele dele era difícil se triturar, se a carne fosse mais macia não teria me dado tanto problema. Quando ele já estava cheio de ferimentos nos braços e pernas, avancei para a região do joelho e cortei qualquer possibilidade de ele se manter em pé novamente. A perna continuava ali, mas, um pouco inútil agora. Enrolei-o no lençol e, todo amarrado, o levei para o calabouço ainda vivo.

Isto já fazia uns três dias, decidi descer e observar o morto-vivo que antes sugava o que me era vital. O desejo sádico havia ido embora, restava à realidade o peso de um passado mórbido. Nunca devia ter me envolvido com um vampiro, nunca devia ter deixado aquilo se tornar parte da minha vida e dominar minha emoções completamente. A pessoa sempre equilibrada tinha se tornado completamente passional, amando intensamente, feito o diabo. Eu havia me entregado até finalmente abrir os olhos e ver que era fonte de alimento para a sua sobrevivência.
Mas ao olhá-lo como um resto de corpo estendido no chão. Encontrei em sua face o espelho que eu temia. O criador se encontrava na criatura. Eu poderia ser tudo, menos igual aquela coisa! Senti-me nojenta e via meu corpo igual ao dele, completamente mutilado no chão. Minhas mãos eram sujas e minhas pernas não me sustentavam mais. Olhava para o teto desesperada! Meus dentes haviam sido arrancados. Os meus dois caninos pairavam na poça ao lado do meu corpo estendido no chão, aguardava para ser enterrado.