segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Tatuagens.

Nunca gostei de tatuagem. Sempre achei exagerado, sem necessidade de inserir algo a mais no meu corpo. Se os outros têm essa vontade, beleza. Vão em frente. Mas sei lá, tinha algo ali que sempre me intrigava. Podia ser o fato de que aquilo não pertencia ao corpo, se aquilo não veio junto do bebê lindo que saiu da barriga da mamãe para que diabos colocar? Ou então devido aquele excesso de cores que surgiam de repente em uma pele uniforme. Desequilibrado, indevidamente desequilibrado. Porque tirar a linda harmonia que havia no corpo? Nunca entendi.

Minha própria casa já virou um centro de tatuagens. As pessoas que moram comigo têm tatuagem. Porque diabos essa relutância insistia em mim? Não podia simplesmente seguir o meio e ser aceita como mais uma dentro do padrão? Não, existe algo aqui dentro que considera horroroso a inserção de tal elemento cheio de tinta no corpo!

Assusta-me o fato de pensar que irão passar a vida inteira com aquilo. Eu não conseguiria, no primeiro mês sairia correndo para tirar. Iria enjoar daquele negocio preso ali. Imagino-me com uma linda fadinha no pé. Depois de algum tempo que a bonitinha já tivesse se acostumado com a moradia em um pé magrelo, eu gritaria até a exaustão obrigando-a a sair de lá. Quem ela pensa que é, gritaria eu, insanamente, chacoalhando meu pé.

Meu corpo é o meu templo. Momento filosofia budista. Meu templo não tem letrinhas japonesas, eu não sei japonês. Não tem desenhinhos em dégradé e muito menos em gradiente. Só sei fazer isto no photoshop pra depois colocar no fundo de tela e ir correndo dizer, foi eu quem fez manhê. Orgulhosa ela me abraçaria e ambas usaríamos o computador mais alegremente.

Meu corpo tem dedos, unhas e sujeira, quando eu ando descalça no chão. Está cheio de cicatrizes, adoro contemplá-las. Sinto um êxtase ao ver que minhas tatuagens são as marcas da vida. Que emoção, minha necessidade com marcas é produzir sempre mais uma que seja muito dolorida. Como o ser humano é masoquista!Ou serei somente eu? Mas quem faz tatuagem também se machuca... Acho que as marcas coincidem com a insanidade de viver. Talvez um dia eu goste até das rugas e ao caminhar toda pelancuda, com os seios no umbigo, o rosto cheio de mancha, eu pense “Ser velho é ter muitas tatuagens”.

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

A cena se repete.

Ela se preparava para prender o cabelo solto. Não se sentia confortável com o estado em que ele estava, todo arrepiado e com as pontas duras. Olhou para os lados, tinha muita gente e muitos carros, era uma dificuldade enorme atravessar a rua. O barulho a deixava meio desnorteada e, sem direção, ela seguia suas amigas, para conseguir arrumar o cabelo e sobreviver à simples loucura que era passar de um lado para outro, em uma rua localizada na cidade grande.

Havia faróis, pessoas rindo, casais sorridentes e ela distraidamente contemplativa em plena Avenida Paulista. Na cabeça, ela se lembrava de tudo o que apreciara ao longo do dia. As músicas do Teatro Abril e também, as emoções vividas e admiradas em uma peça cujo objetivo era despertar o desejo de querer o outro. E o que ela queria naquele momento?


Estava tão serena, nada podia atrapalhá-la. Para qualquer lado que olhasse estava tudo se encaixando, indo para os seus devidos lugares. Os problemas estavam aos pouquinhos sumindo, e ela podia, agora, novamente voltar a admirar tudo o que acontecia, como em um filme, no qual ela era a diretora e assistia tudo de longe, contemplativa.


Mas ali, na parte debaixo da rua algo a chamou a atenção. Eram duas pessoas caminhando lada a lado de mãos dadas. Ele olhava para frente, como quem estava gostando de tudo o que acontecia, o clima o agradava a companhia também, e ela, a acompanhante sorria de uma maneira genuína que ela fazia questão de esconder dele. Era uma felicidade que era só dela, talvez a timidez a impedisse de compartilhar com ele.


Em uma piscada de olho ela viu tudo aquilo naquele casal. Somente mais um parzinho a caminhar e tentando se conhecer. Seria somente isto se aquilo não representasse um susto. O susto. A paralisia tomou conta do corpo dela, atravessar a rua de repente ficou muito mais complicado do que era. Ela tinha perdido o foco.


Aquela sensação a lembra de outra situação de choque, na qual ela se viu enganada. A imagem grudava na mente, de tal maneira, que se torna impossível deixar ela ir embora. A cena continua a se repetir e repetir até você decidir que é hora de acordar.


O choque permaneceu, a euforia a dominou e ela ria descontroladamente ao lembrar-se do garoto que estava começando a fazer parte da sua vida com outra. Triste fim para um início que nem início teve. Veloz e automático, ligou-se o botão do off. Mais um caso, infelizmente encerrado.


O sentimento puro e sincero que surgiu, caia como pétalas que sabiam que seu tempo de vida havia terminado. O chão estava cheio delas. Com a flor ainda viva, a garota aproveitou o momento e decidiu que era melhor soprar tudo aquilo. Que o vento se encarregasse das decisões futuras. Surgindo, talvez, com uma ventania de pétalas, inesperadas, no futuro.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

As cinzas que eu tentei soprar.

Durante a nostalgia da noite, exponho meus pensamentos românticos e intensamente profundos ao computador e como se não fosse segredo para ninguém me desabo em palavras para contar o que há de mais intenso em todos nós.
Sinto a dor, que todos falam, aparecer das cinzas que eu tentei soprar. Como uma enorme fênix que tentou morrer, mas não conseguiu desaparecer do meu corpo. Estou mais presa a isto do que eu imaginava, não adiantou fugir, como poderia eu fugir de mim mesma sendo que o que me motiva a viver é ser amada e amar a minha vida dolorosamente.
Cansei, desisti, isto é maior que eu. E o mais frustrante é saber que ele não tem culpa de nada. Que fui eu, sozinha, que fiz isto tudo, eu e a minha maneira iludida de acreditar no amor. Romantizei a historia que existia e vi no menino o amor, e em mim mesma a chama crescente da paixão sem reciprocidade. É desesperador saber que estou sozinha neste barco que era para ser a dois, é triste lembrar que a fusão que eu mais quero ter não é possível pelo simples motivo que amar é sofrer muito quando não se é amado em retorno.
Deixei-me levar no inicio e parti insegura em busca do meu sonho, porém como nada é fácil e para tudo se deve lutar, eu consegui da maneira mais ignorante receber a única resposta que eu mais temia e desejava desesperadamente para não ser verdade. A minha vaidade foi grande demais para poder acreditar nela e a minha auto-estima baixa demais para crer que eu podia conquistar quem eu tanto queria.
Diante da amargura que eu me encontrei descobri a escuridão. Eu não consegui me levantar, meu trauma foi levado para o inconsciente, e achando que eu estava fazendo a coisa certa eu fechei os olhos e o que me restou foi a esperança de que algum dia alguém os abrissem novamente, mas o meu maior desejo era de que este alguém fosse quem eu tanto, ainda, amo.
Entre lagrimas admito que o meu coração não pode mais ficar acorrentado, terei de soltar este cadeado aos poucos e liberta-lo para que ele consiga livremente admitir para a verdade diante de quem precisa ouvir. Eu devo esta ultima chance a mim mesma, eu preciso tentar novamente e lembrar que a minha versão que ele conhece mudou.

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Seis passos de uma briga.

Arremesso uma pedra
ela dá o início a tudo.
Em um movimento nacísico,
ele se atinge e fica mudo.

Ele ataca com um dado
Nos deparamos com um dois.
Eu insisto!
Mais uma vez jogado,

Quero ser dona da trapaça.
Seria agora o numero três?
Os dentes começam a aparecer.
A resposta vem sempre imediata.

Partimos para o quarto, é quatro.
Já tinha passado o tesão,
meu momento era afobação.
Ele enlouquecia com a minha língua ferina.

No cinco, já estávamos nos quintos
Ele respondia a altura e me queimava
Meu desejo era ser o diabo,
Deixar ele preso no inferno das minhas palavras.

Em uma ultima jogada,
Ele muda a marca no dado.
Saímos flagelados, esgotados.
E aceitamos, doloridos, o que perdemos.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Como respirar em Vênus.

Eram as mãos juntas em sinal de concordância, a caricia que nunca faltava entre a suavidade dos dedos. Um olhando pelo outro, sempre. O mais importante era ficar tudo bem entre eles, não havia diferença que pudesse atrapalhá-los. Tudo na mais simples harmonia, pois nada podia atrapalhar aquilo.

Num determinado segundo, ele afirmou, ao observá-la de longe. “É a minha missão. Fazer ela ficar bem, torná-la segura de si mesma.” Ela estava radiante, brilhava como as luzes que iluminavam seu cabelo dourado. Sorria por tê-lo por perto, gargalhava com uma piada, ria ao ver ele fazer tudo por ela e por todos que ela amava. Era encantador entrar neste universo de sintonia.

Ela comia do prato dele e ele roubava o pedaço de bolo dela. Compartilhavam momentos, sentimentos e palavras. Estavam naquela fase que um já terminava o que o outro ia falar. Não importava quem ia contar a história, ele se sentia satisfeito por ouvi-la contar e ela o perguntava antes se ele queria explicar o que havia acontecido. E o que tinha acontecido era o respeito, a aceitação e principalmente amor.

Da cinzas que restaram de relacionamentos doloridos os dois conseguiram criar uma faísca, grande o suficiente para acender uma chama. Forte e quente ela guiava os dois rumo a uma união sadia, que os tornava grandes.

Um beijinho na testa, um carinho na bochecha, “eu te aceito”, “você me aceita”. Não havia ilusão, era tudo tão perfeito, porque eles se amavam do jeitinho que eram. Dois corações, agora, calmos tentando se entender e se ajudar em uma jornada que, talvez, não tivesse lugar para aquela união no futuro.

terça-feira, 18 de novembro de 2008

Quando está tudo calmo.

Nada a declarar? Portanto silêncio. A boca fechada quer dizer nada. Nenhuma manifestação. Não é um momento que precisa de comentário. A falta de associações de pensamentos para o agora geram, um certo, conforto; comodismo. Puro ócio de idéias, estagnação. Como uma pessoa que não tem prazer nem desprazer, somente continua a criar mais lixo no mundo.

Seus passos são o da inércia, “sigo o caminho que me foi escrito”, puro conformismo. Aceitação barata, dos que tem pouca coragem e mente fraca, para lutar pela única coisa que deveria importar tudo: ele mesmo. Posso seguir parado? A inércia dos que vivem inertes...

O nada é o nada, mas por ser nada também pode ser tudo. O não fazer nada é um aceitar tudo. Viver de nada é se conformar com a indecisão em tudo. O quão desequilibrado você está diante do tudo e do nada?

Seria tudo questão de ponto de vista? Analisando um lado você está parado e do outro caminhando. Será que o caminho que todos seguem é realmente andar? Imitar é fácil. Difícil é sentir o joelho latejando, porque você ainda está engatinhando no seu próprio rumo. Você agüentaria ver ele sangrar?

Fugir para a paralisia é confortável, é aceitar, é desistir de si mesmo. E por mais lamentável que seja observar a estagnação dos conformados, há sempre mais um vendaval a frente para gerar turbulência no vôo.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

O que faz o tempo parar.

Se é para valorizar que seja este momento,
Com enfeites pendurados para entreter o consciente.
Abrir-se à sutil percepção do contentamento,
Para convencê-lo de que o agora se faz presente.

Lembrar constantemente da existência do tempo.
Lamentar o passo que não quer passar sem passar,
E a presença que insiste em ficar e se consolar.
É o eterno intento intencionado pelo descontentamento.

Caminhar pelo masoquismo do sentimento indescritível
Tornar cada decisão parte da sensação intangível.
Olhar com o brilho de quem anseia o que não existe.
Só conhecer a vontade e viver aquilo que não se resiste.

O impossível te impossibilita de se abrir,
A porta atrás que não se fecha não cansa.
Um toque te toca de nostalgia, dói para sorrir.
Fica no peito o que ficou para arder de lembrança.

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

O toque do desequilíbrio.

Tudo feito para você saborear o momento mais podre da sua vida, expondo tudo aquilo que você não imaginava que existia dentro de você, com quedas e recaídas que te transformavam no mais ridículo dos seres. Estando presente em milhares de situações inusitadas, das quais você jamais irá esquecer por serem tão fora do padrão de tudo o que você é ali dentro.

Os primeiros passos são o da ilusão. O sonho e a fantasia te dominavam e os fatos tornaram-se distorcidos a ponto de confundir o que é o certo e o errado. Os parâmetros foram todos questionados e a realidade é colocada em cheque. A dúvida toma conta do corpo, o desejo de chegar logo em algum lugar mata qualquer certeza e o mínimo de garantia que existia evapora.

Não se pode deixar a insanidade dominar para somente buscar o prazer imediato e somente sobreviver. Os desejos não podem se confundir com o prazer. O que é esta necessidade constante de se sentir bem? Até que ponto o prazer está relacionado a felicidade? Confusão entra em cena e os conceitos se misturam a ponto de questionar tudo. Porém as conclusões são individuais, cada um monta a sua e decide o que é melhor para si dependendo do estilo de vida que acha melhor viver. Considerando que, acima de tudo, nenhuma delas é melhor que a outra ou certa ou errada. São todas experiências de vida.

Mas será que o imediatismo merece ser louvado a ponto de desvalorizar qualquer planejamento a longo prazo? Vivam o Carpe Diem como alguém que só quer poupar a vida longa que se pode ter. O instante é essencial para tudo. O Agora é tudo. Este momento é a sua vida inteira, e quem definiu isto foi você. Parabéns, você acabou se tornar a pessoa mais egoísta! Esquecendo dos outros e da a sua contribuição com o mundo.

Tornar-se um nada faz parte das escolhas. Para quem o agora é tudo, o futuro é nada. A filha da putagem rola solta e o amor é questionado. Quem não se ama vai conseguir amar alguém?

Por isto, escolha aquilo que te torne mais do que um animal, um homem pré-histórico que vive pelo instinto. Seja grande, cresça, deixe-se sentir a dor e amadurecer. Não adianta nada se fechar, porque você descobriu que o mundo não é um mar de rosas. Se conforme, o príncipe encantado não existe, a princesa é humana e pode ter chulé, o homem é injusto, fila do banco cansa, vão fazer muita sacanagem com você muitas fezes. Você vai se revoltar, se entristecer, mas o melhor vai ser superar isto e perceber o quanto você poder crescer com isto. Invista na revolta, ela é lucrativa se souber criar dela uma oportunidade. Tenha a calma...

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Posição Tartaruga de Defesa.

De sua base ela podia ouvir a preparação que havia nos outros quartos. Era perigoso sair sem cautela naquele campo minado. Cada passo precisava ser precisamente calculado, sua estratégia de ataque havia sido armada. Após abrir a porta ela correria até a sala e aguardaria encostada na parede do lado do corredor, assim pegaria de surpresa qualquer uma que ousasse passar e atacá-la.

Aquilo não era um jogo com limites. Era guerra! Não havia restrições, qualquer uma fazia suas próprias regras. Não teria como apelar para ninguém depois, pois, ali, elas eram filhas de ninguém e estavam exposta à sujeira do que era aquilo tudo. Só poderiam apela e clamar por alguma interferência divina.

Ouviu-se uma porta abrir, alguém finalmente decidiu sair e dar a cara para bater. Atentou-se aos sons do caminhar com meias, suave e sutil, incapaz de acordar alguém que dormia. Com as mãos fixas na parede e ouvidos aguçados ficaram as duas na expectativa aguardando o encontro. Passou-se muito tempo e nada acontecia, ficar somente esperando era agonizante quando se deve ficar alerta. Não há ser humano que agüente tal ansiedade diante do perigo inevitável.

A tentação de olhar para a outra parte da casa era grande, mas fazer isto era revelar a sua posição. Muito perigoso! Mas será que era melhor ficar só esperando mesmo? Insatisfeita com a dúvida, ela decidiu arriscar. Assim que deslocou sua cabeça um pouco para frente, possibilitando visualizar o corredor inteiro, ela encarou a pessoa que estava fora do quarto. Um choque se estabeleceu entre os dois olhares que se encaravam assustados e ansiosos para a ação.

De repente, escuta-se mais um porta se abrindo. Era a terceira pessoa da casa que demonstrava estar viva e não hesitava em atacar com tudo, sem estratégia nenhuma, simplesmente sendo impulsiva e dando início a mais uma guerra de travesseiros.

O mais importante era derrubar as adversárias e roubar suas armas. A sala se tornava palco para uma perseguição acirrada, os ataques eram intermináveis e sentia-se o cansaço dominar os corpos aos poucos, até haver a necessidade de apelar para água, e todas aceitarem um pausa, na qual elas seriam desprivilegiadas e juntamente beneficiadas.

A liberdade dava-lhes a oportunidade de criar regras e cabia a elas aceitar ou não. Uma decisão, como unir forças contra uma pessoa que merecia ser esmagada, era subitamente criada e apoiada por uma seguidora. Duas contra uma podia ser covardia, mas ninguém estava preocupado com isto, elas só queriam a diversão a qualquer preço.

Em um momento de ataque enfático sob àquela que lutava sozinha, ouviu-se o grito “posição tartaruga de defesa” e ela se encolheu toda, acreditando formar um casco como o da tartaruga. Doce ilusão, as duas guerreiras continuavam o seu ataque tentando desmembra-la com o impacto dos travesseiros no corpo dela.
E ficaram as duas batendo na suposta pedra até se cansarem. Ficou chato, a menina ficou ali quieta sem reagir. Assim não tinha mais graça. O divertido era ver ela fazer escândalo, gritando e berrando feito uma boba. Coisa típica de irmã caçula.

Mas no final a aventura havia sido divertida, elas criavam um universo mágico por alguns minutos e esqueciam das responsabilidades, da pose, de tudo que as tornava adultas e viravam somente três “meninas perdidas”. O que restava era somente a afirmação entre as respirações cansadas: “Precisamos fazer isto mais vezes”.

terça-feira, 28 de outubro de 2008

No balanço do busão.

Lá estavam as duas caminhando para mais um dia de trabalho. Toda manhã a rotina tomava conta de suas vidas com o despertador, o despertar e o que ficava desperto ao sair de casa. “Vamos logo Liebe”, ela ouvia e cuspia o que sobrou de pasta de dente e saia correndo, fechando a porta e entrando no elevador rindo de alguma palhaçada.

Uma comia a maçã, outra deixava o sapato de salto na bolsa. Cada uma com um estilo de vida diferente iam rumo a mais um dia de trabalho comentando do sapatinho novo ou da música nova que baixaram. Uma ia para empresa, a outra para agência. Mundos diferentes dentro da mesma casa separados por opiniões e definições.

As duas se sentavam no banquinho olhando para o início da rua por algum sinal. Uma sempre pegava o ônibus cheio e quase nunca tinha onde sentar, assim ela apelava para o chão e espaços que tinham entre os bancos. A outra tinha a oportunidade de nunca se sujar e sempre ter um assento a aguardando. Elas aguardavam os famosos “Terminal Capelinha” e “Terminal Jd. Ângela”. Havia até grito de cada uma “Aooo galera do Terminal Capelinha” e as duas fingiam fazer o onibus gritar! Ou então era “Aooo galera do Terminal Jd. Ângela”, ai o grito mais parecido com um urro devido a super lotação.

Porém como nem tudo são flores, havia dias em que a casa se reunia para relembrar de maravilhosos momentos vividos dentro do transporte público paulistano. E que maravilha, meus senhores, era lembrar de que aquele transporte levava milhares de pessoas espremidas, tentando inutilmente se segurar em canos nojentos e sentindo o delicioso odor de axilas sem banho.

As seis horas da noite entrar no ônibus era quase insanidade, dependendo da situação. Aquilo, sim, era adquirir experiência de vida. Ali imperava a lei do mais forte! Todos se tornavam animais que aguardavam ansiosamente um banco vagar para poder atacar. Ficavam todos em volta das regiões mais propensas a liberar um assento, sondando quem sairia primeiro, como urubus que ficam lá do alto esperando o animal apodrecer. Grávidas não tinham vez, e quem é que tinha? Eram todos vitimas do cansaço de mais um dia de trabalho.

O inferno era maior ainda dentro dos trens. Pessoas batiam nas portas, alguns caiam no chão sendo arrastados pela multidão. A massa não tinha nome, não tinha razão, simplesmente lutava para sobreviver. O inferno dominava o que deveria ser somente o meio de todos chegarem em sua casa.

Porém, a terceira pessoa da casa não participava destas loucuras. Ela tinha o prazer de usar o metro. Ah, aquilo era “suave”. Também tinha sua insanidade as 18 horas da noite, mas nada desesperador. Um pouco apertado, mas aquilo era inevitável.

Mas o que podiam fazer estas três garotas indefesas diante das atrocidades da capital? Lutar pelos direitos de todos aqueles que utilizam transporte público? Talvez, mas elas ainda era três pessoas como qualquer outra na sociedade que não sabiam direito como fazer isto. Por ignorância a maioria se mantinha calado. E quem cala consente.

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

O precipício

Já faziam horas que ela se encontrava naquela situação, ou seriam dias? Talvez já fizessem meses a fio que não a ajudavam a progredir. Caminhar significava tomar uma decisão. Muito mais do que uma simples “direita” ou “esquerda”, este primeiro passo era um “sim” ou um “não”. Decisão difícil, pois determinava fechar ou não uma porta que, por enquanto, estava aberta. Porém, mantê-la intacta também era perigoso e aceitar tudo. Será que era isto mesmo que ela queria?

Indecisa e sempre analisando criteriosamente os dois lados, ela tinha medo de tomar a decisão errada. Diante deste questionamento ela percebia que não existia decisão errada, somente a que ela achou mais apropriada naquele momento dependendo da situação em que vivia. Com medo, também, do que seria melhor para o seu futuro ela ainda continuava sem se locomover.

Dar o primeiro passo e aceitar tudo aquilo significava perigo! Uma jornada que não teria volta, cheia de caminhos sinuosos e muito apertados. Era tudo muito tenso, olhar para baixo e ver aquele abismo. Admirar a loucura do salto e lembrar de como é prazeroso se jogar e flutuar. Sentir o seu corpo leve, a respiração solta e cheia de suspiros. Somente deixar o seu corpo ser tomado por esta brisa leve que te guia a lugares encantadores e cheio de romance. O paraíso das sensações no melhor momento de todos: agora.

Ela não tinha mais certeza de nada. Será que era isto mesmo que ela queria? Valia a pena se arriscar, mesmo sabendo que no meio de caminho poderia não existir uma mão que a agarrasse e a segurasse em uma pedra qualquer, antes que caísse no chão. Poderia acontecer novamente aquilo que ela menos queria, sentir-se cortada em pedaços, ter cada parte do seu corpo bruscamente rompida com o passo em falso que ela deu diante do precipício.

Era o risco, o medo, a indecisão e a impossibilidade de ver o outro lado que a deixavam paralisada. Ela só queria a certeza de que no meio do salto ela ia sentir uma mão puxando por ela para uma parte bem gostosa cheia de carinho e afeto, que demonstrariam que a decisão valeu a pena. Ela não se importava com o fato de que aquela mesma mão poderia segurá-la um dia, poderia soltá-la, e assim, ela se espatifaria no chão em pedacinhos muito menores ao ponto de não saber mais como se juntam as peças do quebra-cabeças que formava o seu corpo dolorido.

Depois de juntar todas as partes ela se sentiria renovada, olharia para cada cicatriz com orgulho. Cada pedacinho do seu ser representaria um aprendizado, uma lição, que por mais dolorida que tenha sido, marcou o seu ser por inteiro para formar a pessoa dela. Ela não carregaria mais a dor, pois esta, o tempo ajuda a curar com as mudanças que a gente sofre. Quando menos imaginamos, a dor não é mais sentida, o lamento não tem mais motivo, só existe a lembrança de uma época que fez parte do que você é hoje.

Por isto, ela gostava de se jogar, por isto, ela não tinha do que se arrepender. E sempre que se via olhando lá para baixo do precipício era porque ela já tinha se atirado.

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Acordo Silencioso.

Elas sabiam tudo uma da outra, cada uma tinha a sua opinião a respeito de cada atitude das outras. Ali, a privacidade estava nas idéias, a liberdade de se expressar era reprimida pelo sentimento de medo. Todas se entendiam, se respeitavam e se aceitavam. A tolerância era a base da paz na convivência, porque elas precisavam guardar detalhes que, se revelados, machucariam todas.

A necessidade de manifestação não existia mais, era só abaixar os olhos enquanto a outra contava o que havia acontecido que elas sabiam que existia algo naquele olhar baixo que as afastava e que talvez nunca fosse revelado. Segredos que jamais seriam expostos tão levianamente. Opiniões tão bem formuladas e presente na raiz da relação que, uma vez exibidas, ativariam o vulcão adormecido.

Era um acordo silencioso. Cada uma em seu canto, ciente da outra e com sua próprias análises baseada em uma mesma realidade. O filtro existente no interior de cada uma delas era completamente diferente do da outra, o que tornava um mesmo momento com diversos caminhos a se analisar e, assim, impossível de encontrar uma verdade absoluta.

Era esta verdade absoluta que elas colocam como desculpa para a repressão do que as afastava. Sabia-se que se elas ficassem nuas, nunca mais se veriam vestidas entre elas. Mais do que sem roupas elas sentiriam na pele cada arranhão que ecoaria das palavras com o veneno da opinião.

Por isto, era melhor manter-se o silêncio. Tudo continuava bem. O amor é tão grandioso que nos fazia aceitar cada absurdo! E era assim que sempre continuaria, aceitando cada traço de humanidade presente em toda situação que a outra descrevia. Este sacrifício era a maior prova de carinho que elas podiam demonstrar por sentirem medo.

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Reencontros e Reviravoltas.

A cozinha estava lotada e no ar sentíamos o impacto da ousadia dos jovens que, descontrolados, buscavam diversão. Não parava nunca de chegar gente trazendo sempre mais combustível da alegria. Era o momento de extrapolar para rir da cara dos amigos e com eles. Abraçar quem a gente ama e sentia muita falta, brincar de siga o mestre com a musica controlando cada passo de insanidade.

Ouvir metal no piano de madrugada, deixar-se enervar por acreditarem que a paixão está acima da ética, descontar em quem não deve e receber chocolate na boca na hora do parabéns. Milhares de sensações ao mesmo tempo em uma mesma noite.

Chorar diante do amor e união, odiar a susceptibilidade da paixão e mesmo assim sair correndo para abraçar e dizer o quanto você ama. Demonstrar também que já amou de forma ardente e hoje ama de forma pura. Tudo isto diante da mais instável realidade.

Conflitos de mundos, pessoas que nunca se viram se encontram. São tantos absurdos que o real torna-se fantasia e a imaginação não se preocupa mais em ser intangível. Diante do desconhecido o homem perde a noção e faz o que ninguém espera.

É o encontro da ansiedade com a felicidade que vai e vem por momentos prolongados durante uma noite e uma manhã em que todos diante da loucura demonstraram a maior cumplicidade e fraternidade pelo outro.

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Estado de Consciência imediata.

Enquanto ela assistia TV na sala ela podia ouvir também o barulho da chuva lá fora, a mãe na cozinha mexendo nos talheres, a maciez da almofada que ela estava agarrada e o chocolate que ela mal sentia o sabor. Tudo naquele exato momento a tornava inconsciente da realidade. Ela não tinha percebido que estava há meia hora acariciando o veludo da almofada, nem que a mãe estava fazendo a janta cuidadosamente para toda a família e a chuva só era notada quando um trovão a assustava.

Neste estado de embriagues do presente, ela percebia que estava inconscientemente alerta e assimilando sutilmente as peculiaridades do momento. Não havia análise, era tudo incrivelmente sensorial e sem necessidade de associação para compreensão da situação. Ouvir o barulho delicado dos pingos ansiosos para cair no chão era uma percepção inconsciente da parte de um todo que ela fazia questão de somente admirar.

Para ela não havia a necessidade de estragar a imediaticidade da percepção do presente e inserir signos do repertório construído por ela. Era maravilhoso aproveitar sem entender, sentir sem saber porque, amar e não saber explicar.

Uma inconstância que sempre ressurgia quando as palavras delas não sabiam explicar os sentidos, e as vezes eles não tinham explicação. É parte do universo da ignorância , da preguiça de associar com outros mundos, mas também era parte da mais pura percepção de primeiros impactos e admiração das surpresas.

Mais um trovão a despertou dos devaneios. Será que era ela que ao racionalizar a percepção a compreendia de maneira individual e conseguia somente uma interpretação de milhares ou então a sensação era tão irracional que jamais teria razão?

Ela se jogou no sofá abriu um sorriso, fechou os olhos e percebeu que ela preferia não responder.

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Cutucada por agulhas invisíveis.

Sai de perto. Me abraça. Me toca. Porque você quer me empurrar do sofá? Larga mão de ser ridículo! Ah, agora você vai ver. Se fodeu. Toma esta e esta e mais esta, satisfeito? Mas que moleque insaciável, mesmo todo arranhado ainda insiste. Qual é a tua meu? Pronto. Agora você vai ficar ai. Quietinho sem poder se mexer e nem ousar me empurrar do sofá. Feliz?

Ai que frio. Me abraça. No que você acredita? Você está tão quente, como consegue? Eu to tremendo de frio. Deixa eu me ajeitar melhor. Isto, assim está bem melhor. Ah é tão bom ficar assim. Eu também sinto isto, sabia? O que dói em você, dói em mim também. A gente está tão perto. “Sinto vontade de chorar, mas não vou”. Suspiros. Só quero ficar aqui do seu lado quietinha.

Em São Paulo eu não vejo as estrelas. O seu lamento é do coração. Você deixa a dor guiar suas canções. A turbulência que me assusta, me fascinou. Foi esta instabilidade que me fez querer te agarrar. Deixa eu te bater? Porque me sinto completamente sem armas ao seu lado? Seu filho da puta, porque fez isto comigo?

Adeus. Acho que a gente não vai mais se ver. Até uma próxima vez, quem sabe. Ninguém sabe o que nos aguarda. O que ficou foram as marcas nos braços e nas costas, a barriga beijada, o pescoço seduzido pela língua e o lamento dolorido na alma.

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Inebriada com o cheiro de lã.

Aquele universo infantil nunca havia a abandonado. Ela sempre se lembraria de como era acordar para continuar na cama pensando e olhando os fios quase que invisíveis no ar. Observar, com o prazer de quem tem o tempo livre como vida, e sentir a eternidade de cada segundo nos pontinhos brancos que a luz fazia aparecer a sua volta. Era este o encanto que a fazia lembrar do mundo gigante que ela temia e aguardava ansiosamente para entender.

O cheiro da roupa de lã que a mãe colocava fazia parte da despreocupação que ela sentia no presente e medo que ela sentia do futuro. A garotinha se via pequenininha diante do conhecimento do mundo, acreditando, ingenuamente, que eles sabiam o que faziam com tudo o que se transformava diante dos olhinhos assustados dela. Mais crescida, ela descobriu que todos eram ingênuos como ela e que, também, acreditavam em “alguém” que sabia o que fazia.

Desorientada, ela sentiu o pavor diante desta loucura. Se a ignorância é fundamental seria melhor que ela fechasse os olhos e fingisse que não havia nada, afinal, o pior cego é aquele que não quer ver. E parte destes cegos ela não fazia.

Mas e o berro engolido, as lágrimas que não desceram e o aperto eternamente ignorado no peito? Era facilmente justificado pela frase que cresceu ouvindo na voz de sua mãe: “tudo tem seu tempo certo”. Não adiantava nada participar da loucura que ela prezava contra tudo, nem da desordem que acabaria com a ordem estabelecida, a falta de organização devia ser externa, não podia contagiar. Uma muralha era erguida como uma faca afiada, apunhalada por mãos bem treinadas em cegar a verdade que não podia mais existir dentro dela. Um dia os berros de quem não fingia seriam ouvidos, enquanto isto, ela aguardava a oportunidade.

A falsa ordem interna só acalmava a mente, os sentimentos ainda queriam desabar. E a alma ansiava, sem nem imaginar, pelo encontro errante com algum outro visionário. Esta ansiedade foi acalmada, o sentimento desenterrado e a criança só queria colo de tanta dor que a invadiu. Doía, ouvir as mais tristes verdades de maneira tão simples e pura.

Eram dois lados de uma mesma moeda. Os dois enxergavam o mesmo problema e a solução de cada um ia por caminhos opostos. Só alguém tão absurdamente diferente a faria perder o chão e sentir o seu apoio sumir sem rumo nenhum diante da emoção. Eram dois caminhos para um mesmo sentimento.

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

A dor do vazio.

Como se tivesse todo o tempo do mundo, ela se aproximou e vagarosamente depositou o seu corpo sobre o acolchoado da cadeira. Não estava leve como antes, sentia que tinha adquirido o dobro do peso após ouvir uma palavra. Olhou para baixo e começou a admirar o vazio que criava diante dos olhos, o invisível mundo que ela reproduzia na estampa do carpete avermelhado.

Cheio de instantes que marcaram suas sensações, os seus devaneios a perturbavam constantemente. Ficar acordada era reviver as dores que não iam embora e estavam nas memórias que ela sempre quis esquecer, mas nunca conseguiu. Admirar os pêlos e a sujeira do tapete no chão tinha virado rotina em sua vida mansa e monótona, assim como um sorriso sem emoção, agora, era parte do processo imediato de cumprimentar uma pessoa.

Haviam duas formiguinhas levando um pedacinho de pão entre os pêlos do carpete, e atravessaram despercebido pela garota da cadeira que sempre analisou tudo nos mínimos detalhes. Não havia mais motivos para admirar a sua volta, tudo estava confuso e nada esclarecia o que ela sentia. Aquela agonia não a abandonava e todos os passos pareciam ser falsos em direção ao futuro que se tornava cada vez mais embaçado.

Era igual a um banheiro que depois de uma ducha quente fica com o vidro todo embaçado e coloca a nossa disposição um quadro em branco para grafar o que quisermos, porém, no caso da solitária garota da cadeira, não havia a possibilidade de escrever o que quisesse, este encanto com a liberdade de escolha para desenhar o seu próprio caminho era parte das memórias que traziam sofrimento.

Não havia mais graça no presente, do passado vinham lembranças sentimentais intensas que a nocauteavam à solidão extrema, mas o que mais doía era a apatia constante em que vivia sem conseguir enxergar o que viria depois. Se é que existia depois...

Ela ajeitou-se melhor na cadeira de madeira, olhou para o teto e estava tudo branco, de rente. Não tinha nada ali que lhe dissesse alguma coisa, tudo sem nada , vazio, sem objetivo. O monocromático a invadira e a dominava por inteiro sem a deixar respirar, como a língua venenosa de uma serpente capaz de selar seus lábios subitamente para o amanhã.

Olhou para os lados e notou que não havia ninguém. Sozinha ela passou por tudo que viveu e passaria tudo o que viria da mesma maneira, sendo incompreendida e na agonia. As bochechas ficaram molhadas, ela nem tinha percebido que lágrimas haviam escorrido, tentando em vão limpar a angústia do seu ser.

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Que manifeste o Podre!

Buscando captar o lado mais obscuro do ser humano, me deparei com o que todos tentam esconder a sete chaves como se fosse a maior vergonha do mundo. Tudo aquilo que ao ser mencionado faz uma onda de vermelhidão tomar conta do seu rosto e te inibe de qualquer atitude normal evidenciando que ali, realmente, tem coisa.

Era só perceber que, quando um assunto era sutilmente mudado, havia alguém tentando esconder os traumas que ainda não tinham sido superados. Todos passam por situações delicadas como esta e evitam lembrar que existem excentricidades no bicho que o homem representa.Mas ninguém se lembra que isto é normal, não há nada mais humano do que ser todo torto e grotesco. Expor o seu lado mais podre diante do mundo pode ser um escândalo que todos comentarão, mas quando estiverem sozinhos vão se remoer por se sentirem sujos também.

Entre segredos e absurdos o bizarro acompanha a vida de quem tem intimidade e, as vezes, coloca a cara para bater. Em uma conversa que era rotina, subitamente, aparece o que ninguém esperava deixando a platéia com os olhos arregalados e na expectativa para saber mais e mais. Tudo aquilo que estava guardado dentro da gaveta aparece e vira palco, muitas vezes, de um épico.

O melhor disto tudo é quando existe aquela cumplicidade em esconder algo mutuamente assustador. Laços que são estreitados a cada descoberta, como os que eu tenho o prazer de viver em uma certa república que me faz afirmar com toda a certeza que tabus são feitos para sumirem do mapa depois que uma boa dose de verdade os faz evaporar.

Abaixo a ridícula moralidade da vergonha! Gritarão multidões em um futuro utópico. Todos unidos com o desejo de deixar de ser politicamente correto e demonstrar que esconder o nojento não te faz melhor do que ninguém. Não adianta fazer os outros acreditarem que você é aquilo que demonstra ser. Não, não no fundo todos somos cheio de raiva misturada com maçãs podres, um desejo intenso de vingança e ver o outro sofrer na sua mão. Só não mostramos porque domesticamos os nossos corpos com essa moralidade falsa que torna todos puros.

terça-feira, 9 de setembro de 2008

20 litros em quatro braços.

Tem coisas simples na vida que a gente nem valoriza na nossa rotina, porque é algo tão ordinário e desnecessário para ficar montando estratégias de ações que até ignoramos. O único porém surge quando isso, que seria comum deixar de lado, deve ser analisado.

Foi em diversas situações como esta que eu me encontrei ao conhecer e cuidar do meu novo lar. A toalha não ficava limpa sozinha, o papel higiênico que mais parecia um rolo interminável, de repente, tinha fim; até a comida em cima da mesa ficou pelo menos meia hora no fogão para poder surgir. E quando a água terminava? Ah, aí o negócio não tinha jeito, precisávamos pedir e o moço lindamente a depositava no local que ela deveria ficar. Tudo pronto, tudo perfeito e a casa podia novamente ir ao bebedouro e aproveitar o líquido inodoro.

As coisas mudaram quando as três moradoras do apê sentiram a pressão que todos sentem na vida e começaram a trabalhar. A partir dai a vida não tinha mais jeito, era uma correria só, o tempinho que restava para contar as novidades era apertado e todas iam dormir tarde por causa disto. Quer coisa mais gostosa do que ficar rindo de madrugada até sua barriga doer mesmo sabendo que no dia seguinte você vai estar quase caindo de sono?

Porém havia um momento em especial que reunia as integrantes da república para quase um evento: a inserção de 20 litros de água em seu devido lugar. Com a vida agitada era impossível estar presente na hora que o galão chegava na casa das garotas do interior, então o coitado ficava lá fora de castigo esperando a chegada de uma pessoa caridosa que o colocasse no lugar certo.

Para arrastá-lo para dentro de casa não havia problemas, era só vir puxando e empurrando até a cozinha e dar um berro: “Ae galera é hora de colocar a água no lugar!”. E subitamente apareciam mais duas jovens devidamente vestidas com seus trajes noturnos preparadas para fazer a boa ação do dia. Quatro mãos pegavam no galão e a outra que sobrava ficava na torcida “Go go go”. A força que devia ser feita era enorme para os bracinhos frágeis das donzelas indefesas, se existisse uma competição nas olimpíadas de quem mais coloca o galão de água no lugar, com certeza, perderíamos. Mas em questão de espírito de equipe venceríamos disparado.Quando finalmente obtivemos sucesso em nossa missão a equipe pulou de alegria e gritava em coro “Valeu time!”.

Era sempre assim, uma saga para uma coisa tão comum que ninguém normalmente daria importância, mas a gente dava e se divertia enquanto durasse tudo, porque a gente sabia que aquela coisinha tão boba podia nos fazer ter os melhores momentos e sair saltitantes e serelepes pela casa tentando a todo custo agir como gente grande que não queria crescer.

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Aquilo que mais importa.

E foi assim que as coisas começaram a funcionar: cada uma ia para um lado, mas iam todas juntas seguindo a sintonia do que as unia. Tinha os dois extremos e aquela que estava sempre no meio, fato que ganhou grande significância independe da situação, pois esta era a maneira em que todos podiam ver que elas se completavam de uma maneira estranhamente animadora.

Bastava combinarem que queriam se divertir e o momento estava feito. Produzir sensações inesquecíveis era a maior habilidade daquela união que, com um simples toque, deixava todos sem entender a língua que elas falavam quando cruzavam os olhares e abriam aquele sorrisinho de canto de boca que diz: também adoro tudo o que nos torna únicas.

Uma balada sem graça, de repente, tornava-se a melhor de todos os tempos, porque elas sabem como se divertir sem precisar de nada, talvez um copinho com um liquido que deixa alegre ou uma banda de rock n’ roll que fazia as três balançarem a cabeça e repetirem insistentemente: “esse som é muito bom”. Mas na verdade nada era necessário, as risadas eram um presente divino que fazia questão de visitar a rotina delas e entretê-las com qualquer comentário suficientemente ridículo.

A saudades se apossou dos coraçõezinhos desta jovens mulheres quando sentiram-se desunidas. Não havia nada mais gostoso do que combinar de se divertirem juntas e quando iam duas tornava-se obrigação da terceira acompanhar, porque afinal o maldito tripé só estava completo quando não faltava ninguém. Nenhuma emoção era perfeita quando sentíamos aquele vazio, o melhor era sentir que você amava aquilo mais que tudo.

Sem precisar de justificativas, as atitudes tinham a liberdade que sempre precisaram para se expressar integralmente. Era sempre assim, por isto, aquilo tudo era viciante e deixava todos embriagados com tamanha sinceridade e carinho em qualquer atitude. Como os três mosqueteiros, um por todos e todos por um, lutamos contra um universo que apavora qualquer jovem que quer entrar no mercado de trabalho. Cada uma para uma direção, mas sempre se apoiando naquele momento que mais precisa criou-se uma espécie de casa, com nome e apelidos que simbolizam tudo aquilo que nos faz sentir as mais encantadoras emoções quando, em um abraço triplo, percebemos o quanto isto é importante para nós.

terça-feira, 2 de setembro de 2008

Vermelha de Vergonha.

Há dias em que ser um ator é a pior parte do negócio. Seria mais fácil se eu simplesmente observasse e admirasse tudo por fora, encarando todos, profundamente, para descobrir o que tanto escondem atrás das impressões que deixam. Participar é comprometedor, você é parte das acusações e das culpas que te incluem no relacionamento.

Ser espectador é como estar em frente a televisão e presenciar essa loucura toda sem a necessidade de se comprometer e ainda ter a liberdade de ir pegar uma pipoca para assistir de camarote o quebra-pau. Eu nunca participo de nada quando sento no sofá e vejo a telinha, sou somente uma peneira que filtra cada informação com cuidado para interpretar a situação que eu admiro.

Em algumas situações a vontade universal é fingir que você não existe e que nunca fez parte daquilo, é tudo culpa daquela sensação que te deixa com as bochechas intensamente vermelhas quando está todo mundo olhando, ou então quando a única pessoa que deve te ver impecável te flagra no pior momento possível. Seria melhor que eu não tivesse nunca existido e fosse um mero espírito que norteia os vivos tentando, em vão, contracenar em no palco que, para mim, só tem espaço na platéia.

Infelizmente, ou felizmente no mundo real eu tenho espaço reservado no palco do teatro da vida, onde todos fingem que vivem e ninguém entende o que é entrar em cena. Todas as minhas ações devem estar organizadas em uma cadeia para eu garantir que os acontecimentos sejam resultados na minha trama que varia entre o racional e os lamentos da emoção.

Se o ator é aquele que age, então o meu drama é viver. Mesmo insistindo em me tornar platéia, jamais serei; minha sina é presenciar somente minha vida. Vou desejar sempre ser o diretor, sem ter arrependimentos diante de erros e medos, simplesmente ter o olhar crítico e dizer “corta”. Quer coisa melhor do que tomar as decisões, analisar tudo e não sentir a culpa.

Muito mais do que querer fugir, eu quero desencarnar deste compromisso de arrependimentos e desejos que não abandonam nunca os corpos dos vivos. Talvez fosse melhor estar apodrecida no chão de um caixão sendo parte do nada como o vácuo que não sente nada, porque toda a dor é invisível aos olhos dele.

Qual o motivo de sentir, se não existe explicação para nada? Aguardo ansiosamente o dia que eu morrer para ver todas as explicações destas dúvidas intermináveis. Só espero não me desapontar lá do outro lado, mas talvez minha curiosidade insaciada torne-se parte do vazio e, como vício, continuarei sem saber.

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Sonhos acordados.

Viajarei para o mundo do imaginário prazer dos acontecimentos que queremos que se tornem reais. Dar um passo ao sobrenatural e inconstante criado por nós, capaz de realizar todos os meus desejos exatamente da maneira que eu quero. Deixar-me-ei conduzir ao flutuante universo do inesgotável acontecimento do gozo do meu entreter. Terminarei com a minha verdade e a transformarei no meu anseio por presenciar os sentidos que podem me invadir por completo, dominarei todas as minhas agonias e distrairei a minha razão que não se cansa de buscar a lógica nas atitudes.

Participarei do profundo mergulho da manifestação do inconsciente em qualquer momento de expressão dos desejos que não se solidarizam com você, pois nunca te abandonam deste eterno querer e sonhar em querer.

Acalmarei qualquer descontrole com uma criação única aprimorada pelos meus instintos e manifestada em qualquer olhar distante que nunca enxerga o que existe diante dos olhos porque sua visão é parte do inalcançável. Aprimorarei todas as minhas percepções do que é externo a mim e considerarei a possibilidade de vivenciar entre o fantasioso e o que todos consideram a realidade. Tal consenso pode distorcer tudo a minha volta, até quando sou eu e até quando é a realidade?

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Amor mais maduro.

São coisas que a vida nos traz sem percebermos. Um dia nos apaixonamos pela idéia de estamos apaixonados e nos relacionando e no outro acordamos que aquilo provavelmente não vai dar certo porque você nem observou anteriormente se a pessoa tinha algo parecido com você.

Num primeiro momento há a atração e a vontade louca de estar junto de alguém que também queria estar se relacionando. A carência é o que mais te impulsiona a dividir a sua vida com alguém. São as mensagens de amor de madrugada, os beijos e abraços, as declarações constantes e a esperança de que tudo vai dar certo entre vocês. Mas o “dar tudo certo” depende de muitas outras coisas alem do sentimento.

O ser humano procura um companheiro para se relacionar. Alguém que seja o parceiro nas horas difíceis e nos momentos de alegria. Uma pessoa que entenda a sua maneira de viver e que queira seguir um caminho parecido com o seu. Mas que acima de tudo seja um amigo, uma pessoa que te faz sentir bem do lado dela. Que te deixa à vontade e que você a deixe a vontade também. Confiança é fundamental, mas quando há esta amizade, um confia no outro.

Aquela obsessão pela pessoa, sendo que você nem a conhece, acaba. Você se apaixona pelo que ela é, não pelo sentimento e relacionamento. Você fica feliz por ter alguém que vai seguir pelos mesmos trilhos que você e que seja um companheiro de verdade, que te respeita e é seu amigo, mas que também existe atração.

É a partir destas considerações que o amor começa a ser mais cauteloso. Você fica mais exigente e sabe melhor o que quer para você. O que você realmente precisa em um parceiro que vai estar ao seu lado vai ser fator impulsionador para escolha. Você olha para trás e observa que a menininha foi embora, o que restou foi uma mulher que através da dor aprendeu que o mais importante é saber o que ela quer para ela.

Um companheiro, um caso, uma ficada ou um amigo. São tantas opções que eles podem virar, para que se apaixonar sem nem saber com quem se esta lidando direito. E não é só questão de vida social e profissional, além dos dois ambicionarem um futuro parecido que os impulsione para um ponto comum, os dois devem se entender como casal, parceiros, amigos e aceitar suas diferenças e saber se essas diferenças podem ser trabalhadas de modo a serem aceitas e superadas ou então se são elas que vão afastar o casal.

São tantos porens que parece que a arte da conquista torna-se chata, complexa e angustiante. No entanto, a arte da conquista é um constante aprendizado para lapidar os seus desejos e as suas buscas. É o encontro com o interior que é exposto ao exterior da maneira mais narcisista possível. Essa constante lapidação é eterna e quanto mais lapidado mais difícil é o encontro narcisico. É em meio a tantas frustrações e desejos que você descobre que amar é buscar alguém que vai se tornar especial para você. Um alguém que vai te ensinar muito e que cada vez mais você vai aceitar ela do jeito que ela é. Sem brigas e grandes questionamentos, amar é aceitar.

domingo, 24 de agosto de 2008

Já passou filha.

Pode ser que você não saiba ainda, mas no fundo você, de alguma forma absurda, se deixou levar. Pode ter sido aquela necessidade intensa de suprir o vazio, um momento de carência ou uma situação perfeita ilusoriamente. Pode ser que você tenha juntado tudo e percebido como é ruim ficar sozinha e se deparou com uma nova pessoa, acompanhada por algo que não te larga custe o que custar, que te faz imaginar como o mundo seria perfeito se o sentimento narcísico fosse realidade.
Infelizmente isso não existe talvez você esteja apaixonada por essa situação e cria um amor perfeito para não aceitar um amor real, com defeitos e humano. E este vício é mais difícil de superar do que um relacionamento que não deu certo.
Mas será que é isso mesmo que eu quero? Somente o que é real... Qual a graça nisto? O que seria do mundo se só vivesse na terceiridade? Seria no mínimo entediante e viraríamos como um bando de robôs fazendo o que é certo e seguindo sempre as regras que nos torna uma sociedade organizada.
Eu preciso de toda essa loucura, essa constante angústia e incertezas que nos deixam surpresos quando nos deparamos com a nossa natureza intensa. São os mais ridículos prazeres que não entendemos que nos trazem os mais nobres sentimentos. Por isto, afirmo com toda a certeza: “Não me mostre o paraíso, que se eu for não vou voltar”. Se for mostrar o que você tem de melhor, tenha a certeza que você tocou uma pessoa e o que ela vê em você é aquilo, somente aquilo que foi perfeito para cair em sentimentos inexplicáveis.
O que não tem explicação sempre te deixa angustiado, você quer saber o porquê e essa busca interminável te faz criar mais questionamentos, intermináveis perguntas que não deixam a nossa mente nunca, até você cair na loucura em um dia sozinha dentro de um ônibus olhando pela janela e ouvindo musica nostalgicamente. A cena é forte o suficiente para te fazer chorar. A primeira reação é segurar, não se pode chorar publicamente, eu sou adulta e tenho que saber me controlar e demonstrar a todos que sou equilibrada. E quem disse que aquilo que grita dentro de mim é equilibrado?
Deixa a garota chorar e lamentar e perceber o quão idiota ela foi, o quão ilusório foi tudo isso... Depois, quando o alivio tomar conta tudo será tão pequeno. É como ouvir a mãe calorosamente falar “Já passou filha”. E vem a certeza que vai ficar tudo bem, porque as ilusões não tem mais significado, ainda estão ali, mas não são fixas mais, agora eu posso soprá-las para fora de mim, basta eu escolher.

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

Crise na Casa.

Depois da tempestade sempre aparece o sol, lindo e imponente fazendo todos desejarem que ele fique ali para sempre. O ser humano se une diante de qualquer desgraça buscando solucionar os problemas uns dos outros e enxergar a resolução dos seus próprios lembrando sempre que não está sozinho neste barco.

É assim que um grupo em crise se apresenta: instável, culpando o absurdo e possibilitando a entrada de momentos infelizes como desculpa para qualquer atitude impensada. Foi lembrando disso que construiu-se a vontade de mudar e fugir deste lugar, morar longe para poder viajar e sorrir, era isto o que faltava e era isto que se procurava.

E quando descobre que a causa disso, de repente, explode e tudo que estava desorganizado antes vira uma verdadeira anarquia dentro e fora de você. O certo torna-se incompreensível e a única coisa que se tinha certeza vira cinzas que voa pelo vento depois de um sopro.

E foi admirando cada partícula que não ficava quieta e instavelmente se direcionava pelo caminho da natureza que o vento a levava, que eu notei o que mais importava, o que eu mais queria e o que mais valorizava estava ali diante daquela bagunça que começava a se organizar diante da erupção de emoções. Os momentos que eu mais prezava começavam a se concretizar novamente da mesma maneira de sempre, com muita alegria formando a união de um tripé que não sabia caminhar somente com dois pés.

Aos poucos os choros e lamentos tornaram-se risos e abraços sempre abertos para qualquer situação, mesmo naquelas em que seu corpo não quer abraçar, mas seu coração anseia por um carinho. Devagar o tripé está completo e a base fica muito mais forte com o quarto da casa como ponto de encontro do riso, consolo e desabafo. É num apoio assim tão necessário que cada uma enxerga o quanto tudo isso é importante e quanta felicidade a gente sente quando estamos juntas. Porque é família, parte de mim.

sábado, 16 de agosto de 2008

Floreios e Borrões

Hoje não haverá floreios. Por hora pretendo me reduzir aos borrões que a sensibilidade consegue extravasar em um papel com o intuito de me ver murcha. Com uma parte de mim apodrecendo, motivo o meu ser a realizar um assassinato. Quero ver as pétalas caírem e sobrar somente o miolo apodrecido que se torna em adubo para o futuro. Vestir-me-ei de luto, preto será a minha nova cor. Como fico com essa sensibilidade monocromática? Dramática o suficiente para jogar fora uma utopia de viver.

É essa intangibilidade unida com a maior de todas as complexidades de possível retorno ou completa separação que me apavora e me deixa inconstante, capaz de tornar real a maior das surrealidades que gritam impacientemente dentro de mim.

Em meio a essa gosma grudenta e preta que não abandona o meu peito, eu pego a pena molho nesta tinta e deposito em cada palavra aquilo que tinha em mim. São borrões a base de uma tinta formada por pétalas apodrecidas.

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

O Surto.

O que leva o que está calmo em busca do transtorno? Uma essência sadia rondando o doentio e ardente. O arfante querendo o eterno suspiro. Ou uma respiração de encontro ao seu fim.
Como achar respostas para a constante e eterna inquietação da insatisfação. O quão imatura eu devo sempre ser para conseguir controlar sonhos, desejos e verdades que nunca vão se tornar realidade. Qual a melhor maneira de poupar sofrimento e ao invés de viver agoniada, simplesmente ter conhecimento o suficiente que fizesse tudo isto ser inexistente.
Por que não consegue-se estar feliz na solidão sendo que é nela que estamos com quem mais amamos? Será que a conveniência em estar vivo é com você mesmo ou com os outros? É tudo uma convenção de morais e crenças que te fazem desacreditar de si mesmo.

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Marcas...

Podia ser só uma vingança, mas no fundo era mais do que isto. Uma semana longe a faria apelar para qualquer artifício. O mais desejado era algo que deixasse lembranças.

No escuro não era possível ver o que se fazia direito. Mas isto não importava, o que valia era sentir. Ter o prazer de sentir o atrito das peles. Uma mão aqui e outra ali. Valia de tudo para poder saciar aquela vontade de querer.

Joguinhos com balas, dentes e bocas foi o que impediu a compreensão do filme. Mas quem se importava com isto se a pessoa ao lado te fazia sentir vontade de quebrar o braço da poltrona sem hesitar.

Eu te desejo, eu te quero, posso ir pro seu colo? Ah! e a resposta era sim! Quer maior calor do que este? Beijar até não sentir mais as partes do corpo de tanto que beijou.

A ponta do nariz tinha ficado anestesiada. Mas o pescoço. Uh, o pescoço. Este ainda estava disponível para qualquer atitude vampírica. E os caninos que se segurassem, porque o desejo pedia que a língua conhecesse a pele. Mas isto não bastava, a vontade de fundir os corpos implorava pelo sabor fazendo os dedos do pé se espremerem de prazer.

Suspiros, sorrisos. Sim você realmente me tira do sério! Posso ir pro seu colo de novo?

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Tira isso de mim logo.

Tirar dente do siso me deixou numa solidão danada. Estou tentando me manter acordada com o gelo dentro de duas sacolinhas plásticas e enrolado em uma fronha para garantir que não vai inchar.
Já deve ser quase duas da manhã e eu aqui me conscientizando que é melhor manter o gelo do que dormir e acordar com uma bolota no rosto.
Já é a segunda vez que passo por isso. Na primeira foi sossegado, nem acreditei que tinha arrancado 2 dentes! "Só isso?" pensei eu ingenuamente. Quando o dente não está deitado não há problemas, a cirurgia dura pouco tempo mesmo, como a minha que durou somente meia hora. Mal sabia eu que o pior me aguardava. Eu não coloquei gelo e ainda tomei Tylenol (porque diabos tomei um remédio que não faz efeito nenhum em mim?). E o bendito não fez. A dor veio com tudo... Me senti gorda de um só lado do rosto! Sim isso é possível! Queria deitar, descansar, a pressão estava baixa e minha mãe pedindo ajuda o tempo todo porque ela não sabia como fazer as coisas dela dentro da minha casa. "Mãe deixa eu morrer aqui na cama em paz, por favor". Acho que era pedir de mais.
No dia seguinte acordei com uma linda bolinha do lado esquerdo do rosto. Ela era muito simpática! deixou meus músculos enrijecidos e doía para sorrir e abrir a boca. Lamentei a existência da dor quando eu queria soltar uma deliciosa gargalhada ao me olhar no espelho.
Aquela desgraça demorou 4 dias para sumir do meu rosto. Mas pelo menos não ocorreram grandes problemas. O buraco foi bem fechado, a comida não entra lá dentro e os pontos saíram naturalmente. Depois, eu voltei lá com coragem para tirar mais dois. Ainda bem que são quatro só! Eu sentei ansiosa e nervosa, ia passar por tudo aquilo de novo. Que agonia! Ver Aquelas espatulazinhas entrando na sua boca e saindo com sangue, ver a agulha e sentir ela furar sua gengiva soltando um líquidozinho com gosto horrível, sentir a pressão, quer coisa pior do que aquela pressão? É um empurra pra cá, um empurra pra lá. Deus que me livre, não teria coragem de ser cirurgiã dentista nunca.
Mas desta vez foi terrível! O dente de cima foi de boa. Os dentes de cima são bons garotos. Mas o debaixo... Aquele maldito me fez sofrer. O dentista teve que quebrar, e colocou um aparelinho que fazia barulho! Me senti no filme o massacre da serra elétrica e a vítima era o meu dentinho. O coitado estava lutando bravamente para sobreviver e eu torcendo desesperadamente para que a serra elétrica vencesse logo esse jogo interminável.
Quanta agonia, meus pés se contorciam e meus dedos se espremiam tentando aliviar a sensação, mas era impossível. Nem mesmo minha mão firmemente presa ao encosto da cadeira fazia tudo aquilo passar.
Depois de três sessões de massacre eu pude finalmente me sentir livre. O dente tinha saído! Mas segundo o dentista ainda faltava um pedaço. Era só uma lasquinha insignificante. Graças a Deus! Havia terminado, eu não acreditava. ainda com a gaze eu queria sorrir. Até ele me lembrar, com uma agulha em mãos, que ainda tinha que dar ponto. Verdade, não pode se esquecer dos danados. E foram 5 pontos que eu simplesmente ignorei. Não havia terror nisto, o pior foi aquela agonia toda durante a cirurgia. Os pontos foram só alegria. Já podia comemorar tinha arrancado os 4 dentes do siso.

quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Momento Auto Ajuda.

Primeiro vem o grito. O choque é tamanho que é inevitável gritar. Ao redor existe tudo aquilo que foi construído por você. E é este o problema, o que foi construído por você.

É apavorante olhar pra trás e perceber que todo o tempo você não saiu do lugar. A paralisia foi ininterrupta, o estado de inércia foi mais forte do que qualquer outro desejo de continuar caminhando. A preguiça toma conta do corpo como desculpa do medo, e mais uma vez um dos sete pecados é a causa que encobre uma verdade que você jamais quer revelar, porque dói.

Quando este sono dura muito, o despertar é mais dolorido do que se imagina. Há casos em que nunca se desperta. Para que acordar se o conforto da preguiça te acolhe? Não há necessidade de autoconhecimento e entendimento dos motivos. Descobrir os porquê dentro de cada atitude pode ser um pesadelo, e despertar dele e encarar que tudo aquilo é real e é horrível.

Monstros, bichos papões, espíritos malignos, todos estes nos atormentam através do terror. Esse horror todo é insignificante perto do pavor que podemos criar para nós mesmos. Descobrir-se fraco e incapaz é um mérito. Mas coragem é aceitar esse desafio e enfrenta-lo. Aceitar que eu sou fraca em determinadas coisas e morro de medo de enfrentar certos desafios. Eu devo perceber que isso é algo meu que deve ser superado, parte da minha humanidade que deve crescer e aprender que isto não passa de mais um aprendizado que vai ficar comigo para o resto da vida.

Aceitar o seu próprio defeito é um conflito interno muito grande. Não importa o que o mundo acha ou exige de qualquer ser humano, não se deve deixar abater porque você sofre de um mal que toda a humanidade tem. São poucos aqueles que ao invés de deixar sua humanidade de lado a encaram e percebem que aquilo é natural e não há problemas em existir, só existe problema se você não supera-la.

Não importa o tempo. O importante é o aprendizado, é a não repetição. É o crescimento e o entendimento de como viver bem em sociedade. O mais importante de tudo é estar bem com você mesmo. E não há objetivo que mereça ser desfeito por um desafio que criou medo e problemas a serem superados.

Força e confiança são necessárias para a conquista do que se tanto deseja.

terça-feira, 5 de agosto de 2008

Certas Mãos.

Certas mãos que te tocam deixam sensações eternas em você. Pode ser o calor, a pressão, o carinho ou um simples choque que machuca de tanta euforia. Aquele momento intenso que te faz criar memórias que sempre voltam e insistem em te lembrar que você já o valorizou. Faz você olhar para o nada, ouvir uma música calma e reviver as mãos, a delicadeza dos movimentos com a suavidade que é tocar.

É lembrar que foi mais de uma mão que te marcou e algumas nem te tocaram, mas tocaram. Algumas só existiram ao seu lado, resistentes insistindo como um punho fechado que não quer mostrar a palma, mas no fundo anseia que alguém descubra o quão sensível é a pele da palma.

Foram linhas e melodias, todas em um momento presas na mão e no outro flutuando como uma pluma. Você agüenta, tenta não estagnar e lembra, depois, como um sopro e voa para uma época que não volta e só restam sensações.

Algumas mãos foram finas e traziam a tona o que há de mais feminino no homem, a sua sensibilidade e denuncia de entrega. A doação do ser que anseia ter o outro e que acredita que completar-se com alguém pode ser felicidade.

Outras foram ásperas o suficiente para deixar cicatrizes depois de somente um toque ou então mais de um. Capazes de te fazer olhar para trás e retomar o que já não mais existe e observar de perto tudo o que ficou em você depois disto.

Aquilo que te mais machucou, mais te ensinou. A repetição é desnecessária agora que o olhar tornou-se apurado para entender. Certas mãos não te assustam mais, nem te deixam sem jeito, por mais ásperas que sejam o que todas desejam, no fundo, é uma outra que as toque.

quinta-feira, 31 de julho de 2008

A ponta do nariz formiga.

Eu nunca fui uma garota de beber. Preferia tomar suco enquanto todo mundo tomava a rodada de chope. Eu não sentia prazer naquilo, era ruim, o que, para mim, significava que beber era algo de pessoas desequilibradas, que estavam mal consigo por algum motivo, ou então o hábito daqueles que queriam parecer mais velhos, mostrar que já estão maduros. Podia parecer idiota, mas era isso que eu achava. O mais importante era cuidar do meu corpo sem tomar essas bebidas desnecessárias.

Um dia, porém, vi-me diante de uma situação na qual eu não tinha escapatória. Os elementos que moram comigo estavam interessadíssimos em comprar uma bebida desnecessária. Eu como uma bixete no assunto não sabia nem qual bebida era melhor para o momento: “beber até ficar retardada dentro da nossa casa”.

Elas escolheram uma lá. Uma tal de Natasha. Coitada da mulher, usamos e abusamos dela a noite inteira. Eu não sabia dizer se era boa ou ruim, nunca tinha tomado destilado de verdade, só bebericado, mas isso não vale.

O esquema era Natasha misturada com Fanta Laranja ou Sprite. Exótico. Era tudo novo pra mim, e as meninas estavam achando o máximo o fato de eu nunca ter feito isto. Chegamos em casa e montamos os copos. Eu peguei um que era considerado mais fraco perto dos outros. Mal sabia eu que diante de qualquer álcool toda bebida é forte para mim.

Sentamos na sala, somente as três, falando besteiras e colocando em dia a fofoca da faculdade. Falar mal de professor é muito bom! Ainda mais quando você começa a ficar alegre e ri de qualquer comentário idiota que alguém fizer. Neste dia o mural de besteira da casa ganhou várias frases memoráveis.

Eu estava alegre. Eu notei a diferença quando meu nariz começou a formigar, a minha alegria de ser aumentou e as risadas começaram a ficar intermináveis. Meu Deus, era só olhar para a cara de uma delas que eu ria. Para completar a televisão estava ligada e tivemos a audácia de deixar em um filme, no mínimo, zoado com um árabe dançando por uma mansão. Era só olhar para a tela e que todas choravam de rir.

A situação piorou quando achamos que seria legal imitar a dancinha do árabe. Que lindo. É uma beleza a nossa janela não ter cortina e qualquer outro prédio poder ver essas cenas maravilhosas! O melhor disto é quando você descobre que existe outra republica, só de garotos, em um destes prédios com visão privilegiada para a nossa sala, com binóculos nas mãos para momentos como este.

A Natasha não terminava, eu ainda estava no primeiro copo e tudo já estava muito alegre e girando. Eu ainda tinha que tomar banho. Será que conseguia levantar e ir pro banheiro sozinha? Meu nariz ainda formigava e eu tinha que levantar.

Tomar banho foi gostoso, eu sorria feito uma boba, até parecia sóbria para quem olhasse. E dormir foi delicioso, capotei como um bebê que ainda via tudo girando e não pensava em nada. Acordar não teve problemas, nem dor de cabeça nem nada. Somente lembranças de uma noite muito feliz e uma garrafa de Natasha inacabada. Talvez beber seja irresponsavelmente divertido e com certeza, às vezes, necessário para não parar de rir. E talvez, só talvez eu queira fazer isso de novo.

quarta-feira, 30 de julho de 2008

A Idéia...

Ficar deitada sem pensar em nada, dando a liberdade do cansaço tomar conta de todo o seu corpo até não agüentar mais e se render ao sono. Isto é o que normalmente deveria acontecer todas as noites.Porém, nem sempre tenho este privilégio de sentir-me mais leve. Às vezes, um surto toma conta de mim, torno-me uma obsessiva com uma única missão para ser cumprida: redigir a idéia. Ela que no decorrer dos séculos transformou-se do abstrato ao concreto, de uma generalização para uma simples especificação, hoje é exposta da maneira contemporânea, sem nenhum parâmetro para privá-la da expressão.

Minha obrigação com a idéia é algo que eu me imponho, porque tenho medo de perdê-la. Assim como ela vem, subitamente, de alguns ajustes de pensamentos mal resolvidos, ela pode seguir seu percurso com o vento que nunca se cansa de soprar em minha mente. Espera-se que ela ao menos tenha piedade desta mente cansada de se exercitar o dia inteiro e entenda que até mesmo o aprisionamento tem um bom resultado quando cumprido o seu objetivo.

E quando a missão que deve ser cumprida é somente se fixar na mente como uma pedra que não voa nem mesmo se um furacão passar ao seu lado, o mínimo que deve ser feito é fazer-se presente. É assim que eu me vejo ao lamentar uma idéia perdida, em conflito comigo mesma por ela ter ido embora e eu não a ter anotado e aproveitado antes. O mais importante para uma pessoa insanamente perdida é levantar da cama, custe o que custar, e colocar a idéia no papel, nem que seja somente uma frase para a lembrança.

Ser loucamente esquecida e preguiçosa só te faz criar métodos lusitanos para não perder a idéia. Por isto peço para ela. Por favor, apareça quando eu estiver disponível. Dentro do ônibus a caminho de casa, em um dia no trabalho, logo de manhã no café da manhã quando eu ainda tenho o dia inteiro para aprimorá-la, mas não antes de dormir!

Mesmo a noite sendo o momento mais propício e cheio de características para a escrita, não acredito que a noite mal dormida vai me agradar no dia seguinte. Mas se é esse o sacrifício necessário para sentir-se satisfeito com um bom texto, então me sinto feliz em fazer esse sacrifício.

Alícia Villanova.