segunda-feira, 27 de outubro de 2008

O precipício

Já faziam horas que ela se encontrava naquela situação, ou seriam dias? Talvez já fizessem meses a fio que não a ajudavam a progredir. Caminhar significava tomar uma decisão. Muito mais do que uma simples “direita” ou “esquerda”, este primeiro passo era um “sim” ou um “não”. Decisão difícil, pois determinava fechar ou não uma porta que, por enquanto, estava aberta. Porém, mantê-la intacta também era perigoso e aceitar tudo. Será que era isto mesmo que ela queria?

Indecisa e sempre analisando criteriosamente os dois lados, ela tinha medo de tomar a decisão errada. Diante deste questionamento ela percebia que não existia decisão errada, somente a que ela achou mais apropriada naquele momento dependendo da situação em que vivia. Com medo, também, do que seria melhor para o seu futuro ela ainda continuava sem se locomover.

Dar o primeiro passo e aceitar tudo aquilo significava perigo! Uma jornada que não teria volta, cheia de caminhos sinuosos e muito apertados. Era tudo muito tenso, olhar para baixo e ver aquele abismo. Admirar a loucura do salto e lembrar de como é prazeroso se jogar e flutuar. Sentir o seu corpo leve, a respiração solta e cheia de suspiros. Somente deixar o seu corpo ser tomado por esta brisa leve que te guia a lugares encantadores e cheio de romance. O paraíso das sensações no melhor momento de todos: agora.

Ela não tinha mais certeza de nada. Será que era isto mesmo que ela queria? Valia a pena se arriscar, mesmo sabendo que no meio de caminho poderia não existir uma mão que a agarrasse e a segurasse em uma pedra qualquer, antes que caísse no chão. Poderia acontecer novamente aquilo que ela menos queria, sentir-se cortada em pedaços, ter cada parte do seu corpo bruscamente rompida com o passo em falso que ela deu diante do precipício.

Era o risco, o medo, a indecisão e a impossibilidade de ver o outro lado que a deixavam paralisada. Ela só queria a certeza de que no meio do salto ela ia sentir uma mão puxando por ela para uma parte bem gostosa cheia de carinho e afeto, que demonstrariam que a decisão valeu a pena. Ela não se importava com o fato de que aquela mesma mão poderia segurá-la um dia, poderia soltá-la, e assim, ela se espatifaria no chão em pedacinhos muito menores ao ponto de não saber mais como se juntam as peças do quebra-cabeças que formava o seu corpo dolorido.

Depois de juntar todas as partes ela se sentiria renovada, olharia para cada cicatriz com orgulho. Cada pedacinho do seu ser representaria um aprendizado, uma lição, que por mais dolorida que tenha sido, marcou o seu ser por inteiro para formar a pessoa dela. Ela não carregaria mais a dor, pois esta, o tempo ajuda a curar com as mudanças que a gente sofre. Quando menos imaginamos, a dor não é mais sentida, o lamento não tem mais motivo, só existe a lembrança de uma época que fez parte do que você é hoje.

Por isto, ela gostava de se jogar, por isto, ela não tinha do que se arrepender. E sempre que se via olhando lá para baixo do precipício era porque ela já tinha se atirado.

2 comentários:

Sunahara disse...

Adorei!

Final surpreendende, do jeito que eu gosto... =)

Beijos

Victor Meira disse...

Bacana! Eu achei que a coisa ia terminar no copo de cachaça e na indecisão, à la Camus... O tempo verbal ali do penúltimo parágrafo dá uma enganada.

Belo texto. Sinto falta de mais figuras, mas transborda sentimento. Leva a escolha pra uma figura onde ou a gente permanece ou a gente se joga.

Eu acho que toda escolha é uma escolha entre dois precipícios.

Acho que a gente só fez e só faz escolha errada na vida (e conclui, vez em quando, que a escolha foi certa - quando o efeito é positivo).

Boua.
Legal.